Na Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Aristóbulo Barbosa Leão, em Bento Ferreira, a sala de aula da turma da Educação de Jovens e Adultos (EJA) se transformou em um palco de cores, fios, histórias e muita aprendizagem. Sob a orientação da professora Suzana Claudia Caldas da Motta, os estudantes se reuniram em rodas de bordados e criação de cordéis, descobrindo que a arte pode ser uma poderosa ferramenta de conexão, expressão e cura.
A atividade vai muito além do mero exercício artesanal. É um mergulho nas memórias afetivas, nas experiências de vida e nos sentimentos que, por vezes, são difíceis de expressar com palavras. No silêncio dos bordados, as histórias se revelam e se costuram nas linhas coloridas. Cada ponto é uma página da vida dos participantes, uma forma de dar voz ao que, muitas vezes, fica escondido.
A importância dessa atividade é destacada pela própria professora Suzana Caldas: “As rodas de bordados têm o objetivo de promover escuta acolhedora, vínculo e integração, palavras-chave em qualquer processo de aprendizagem. Essa vivência utiliza o bordado como linguagem, com expressão artística, provocando um efeito libertador e regulador, levando-os a se relacionar com a vida, com o vivido daquela pessoa”.
Bordar, para os estudantes da EJA, não é apenas um exercício tradicional, mas uma narrativa que permite a conexão com a criatividade e a imaginação. Cada ponto, uma página virada na história de suas vidas, um registro de suas jornadas. As histórias que surgem nos cordéis não só exploram a cultura popular, mas também abordam questões críticas do cotidiano, proporcionando uma visão mais profunda da sociedade.
O resultado deste trabalho com os educandos da EJA foi tão expressivo que virou uma exposição, instalada no hall da sede da Secretaria de Educação de Vitória, no bairro Itararé. Inclusive, a professora organizou uma saída pedagógica, para que os estudantes fossem até o local e prestigiassem, de perto, suas produções. Essa experiência deu ainda mais significado e importância para o projeto.
Bordando emoções e aprendizado
Os estudantes aprenderam a unir suas experiências e emoções com a arte, superando desafios iniciais relacionados à autoestima. As palavras de Judite de Fatima Pereira, 63 anos, revelam a forma que a atividade foi significativa para sua vida: “Eu adoro bordar, fico muito feliz quando estou bordando, esqueço das coisas ruins que passam pela cabeça. As cores das linhas que mais gosto são verdes e azuis, são minhas preferidas. Eu bordei meu nome e senti muita felicidade”.
Da mesma forma, Maria Benedita da Conceição, 65 anos, afirma que produzir os bordados de cordéis foi estimulante e proporcionou uma aprendizagem efetiva: “Na minha opinião, apesar de eu gostar de trabalhos que usam a criatividade, produzir a arte do cordel estimula ainda mais a mente. As professoras orientando ajudam muito na nossa aprendizagem. A gente aprende a falar e fazer cordel, como eles fazem e leem”.
Por sua vez, Wesley de Jesus Rodrigues, 16 anos, conta que a partir da atividade passou a ver o seu potencial de forma diferente: “Eu me surpreendi com o resultado do meu trabalho. Quando eu vi o desenho, achei difícil, mas aos poucos eu percebi que sou mais capaz do que imaginava!”.
Luzineide Pereira da Silva Gomes, 51 anos, também destaca que gostou de viver uma nova experiência, e reforça que o projeto também contribuiu para potencializar o aprendizado cultural: “Viver na prática o cordel é uma experiência diferente para mim, que nunca tinha feito. Aprender uma cultura nova é muito bom”.
Aprendizagem efetiva
Para os profissionais da educação envolvidos nessa trajetória, o projeto educativo de bordados e cordéis se mostrou uma estratégia pedagógica muito valiosa para potencializar a aprendizagem dos estudantes.
“Trabalhar a literatura de cordel na EJA é uma estratégia valiosa para promover a aprendizagem, o respeito à diversidade cultural e a valorização da oralidade, contribuindo para uma formação mais completa e inclusiva. Esse trabalho possui grande relevância cultural e educacional por proporcionar acessibilidade linguística, facilitando a compreensão por parte de pessoas que podem ter dificuldades com textos mais complexos. Os cordéis também são uma forma importante de preservar e disseminar a cultura popular, trazendo à tona tradições, histórias e saberes que podem estar se perdendo com o tempo. Utilizar essa forma de expressão na educação pode promover a inclusão de culturas e tradições muitas vezes marginalizadas”, destaca a professora de Língua Portuguesa, Danubia Eggert.
Ainda segundo a educadora, ao abordar os temas dos cordéis, é possível conectar essa forma de expressão com outras disciplinas, como História, Geografia e Ciências Sociais. Ela citou como exemplo cordéis que tratam de temas históricos, que podem ser uma excelente maneira de contextualizar determinados eventos.
Elenice Siqueira, pedagoga que trabalha com as turmas da EJA, avaliou o projeto de forma positiva. “As atividades foram muito positivas e produtivas. Ao longo da semana percebeu-se o entusiasmo e a alegria dos estudantes. Um trabalho que envolveu a literatura e a prática do bordado. Uma práxis dentro do contexto da EJA, valorizando nossos estudantes e o trabalho dos professores”, comentou.
A atividade de confecção de bordados e criação de cordéis na EJA da Emef Aristóbulo Barbosa Leão é muito mais do que uma simples prática artesanal. É uma jornada de autoconhecimento, expressão e aprendizado. Através do bordado e dos cordéis, os estudantes se reconectam com suas raízes culturais, criam laços emocionais e sociais e encontram alegria na criação. É uma experiência que ilustra o poder transformador da educação quando aliada à criatividade e à expressão artística.
Bordados e cordéis: estudantes da EJA aprendem de forma criativa